EUA têm de ser líderes na guerra contra a aids

EUA têm de ser líderes na guerra contra a aids

BONO VOX

The Washington Post

Harry Truman uma vez disse: “Confio nas pessoas porque, quando elas conhecem os fatos, fazem a coisa certa.” Os fatos sobre a aids nos países mais pobres – especialmente na África – são hoje bem nítidos. Eles mostram não só uma tragédia humanitária sem precedentes, mas também um perigo claro e atual para os Estados Unidos.

Na África, 9.500 pessoas contrairão o HIV e 6.500 perderão a vida para a aids hoje, morrendo por causa da falta de medicamentos que subestimamos.

Quando elas morrem, levam consigo seu poder de gerar renda – e deixam para trás seus filhos. A menos que nós, como uma comunidade internacional, lancemos uma guerra contra esse assassino, a África terá pelo menos 25 milhões de órfãos da aids no fim desta década.

Como os historiadores e os críticos dos EUA um dia observarão, uma praga de proporções bíblicas se espalha enquanto os americanos assistem a ela. Uma síndrome do Senhor das Moscas está surgindo: crianças educando crianças. É difícil para o coração não se comover com a imensa perda de vidas. É difícil para a mente não enxergar as implicações da destruição da família africana, das economias africanas, das esperanças africanas, da segurança.

Embora os seqüestradores de 11 de setembro fossem na maioria sauditas ricos, eles se refugiaram no Estado falido do Afeganistão. Deve haver dez Afeganistães em potencial na África. O secretário de Estado, Colin Powell, advertiu que a aids, tanto quanto qualquer nação fora-da-lei, é grave ameaça à segurança dos EUA e à estabilidade do mundo.

Não tem de ser assim. Os medicamentos podem cortar pela metade a chance de uma mulher passar o HIV para seu filho. As drogas anti-retrovirais produzem o chamado “efeito Lázaro”: um paciente à beira da morte pode voltar ao trabalho em três meses. É um bom retorno para um investimento de US$ 1 por dia, que é o que essas drogas nos custam hoje.

Quando me reuni com o presidente Bush no ano passado, ele prometeu que, apesar do déficit, esses esforços não ficariam sem financiamento se pudéssemos mostrar-lhe programas eficazes. Nós podemos.

Investimentos prudentes por meio de ajuda bilateral bem dirigida e do Fundo Global para o Combate à Aids, Tuberculose e Malária estão salvando e transformando vidas com base no que funciona: prevenção, tratamento e cuidados. Vejam Uganda, Senegal, Zâmbia. Não investir agora deixará para nós um déficit moral e, para nossos filhos, as conseqüências de um déficit global de segurança.

Generosidade – Recentemente, viajei pelo Meio-Oeste americano falando sobre a aids. No coração dos EUA, sentimos a decência e a generosidade que brota do solo. E ouvimos o murmúrio de um movimento. Numa parada de caminhões em Iowa, motoristas nos disseram que transportariam medicamentos para a África do Sul, onde 50% dos caminhoneiros são portadores do HIV. Em igrejas em Iowa, Illinois e Nebraska, pediram-me para pregar do púlpito.

Os fatos estão transformando os EUA, como Truman previu. Em milhares de cartas e ligações para a Casa Branca e o Congresso, o povo americano diz que a aids é uma emergência. Especialistas em saúde concordam que são necessários pelo menos US$ 2,5 bilhões dos EUA neste ano para dar a arrancada na guerra contra o HIV e para mostrar aos povos mais pobres que os americanos são um parceiro verdadeiro para a saúde, a segurança global e a prosperidade.

Sou da Europa, onde a reação ainda não está à altura da escala da crise – teremos de seguir a liderança dos EUA nesta guerra. É uma chance de mostrar do que os EUA são a favor e não só do que são contra. Dois bilhões e meio de dólares é muito dinheiro. Mas seria demais para ajudar a salvar a vida de 3 milhões de pessoas negras por ano, cuidar dos 13 milhões de órfãos da aids na África e evitar que 30 milhões de pessoas contraiam o HIV? Duvido que a maioria dos americanos ache que sim.

Em termos puramente financeiros, trata-se de um extraordinário retorno de investimento. A liderança americana forçaria outras nações a fazer sua parte. Quanto mais demorarmos, maior será o custo – medido em milhões de vidas e muitas dezenas de bilhões de dólares. Todo discurso sobre o Estado da União é histórico e todo orçamento, importante. Mas, diante desses fatos, é agora que a liderança americana – liderança global – realmente importa.

Meu negócio é fazer música. O negócio do presidente Bush é fazer história.

Estou convencido de que, se ele declarar diante do Congresso que a epidemia da aids na África é uma emergência, tanto americanos quanto pessoas no resto do mundo se oferecerão para ajudar. E, se ele apoiar seu compromisso com seu orçamento, mostrará ao mundo o tipo de liderança que só os EUA podem oferecer.

O autor, líder da banda U2, é ativista da aids e fundador da organização Dívida, Aids e Comércio na África

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