U2 entre os 100 maiores artistas na revista Rolling Stone

U2 entre os 100 maiores artistas na revista Rolling Stone

A revista Rolling Stone Brasil traz uma edição especial (R$ 19,90) com os 100 maiores artistas de todos os tempos. O mais interessante é que os textos são assinados por grandes nomes da música.

O U2 está colocado na 22ª posição e traz um texto escrito pelo Chris Martin, do Coldplay. Já Bono escreveu sobre o Elvis Presley (3° lugar) e o Edge fala sobre a banda The Clash (28° lugar).

Confiram abaixo os textos na íntegra!

U2 por Chris Martin – Não compro passagens para passar o final de semana na Irlanda em frente à casa deles, mas o U2 é a única banda cujo repertório inteiro conheço de cor. A primeira faixa de The Unforgettable Fire, A Sort of Homecoming, sei de trás para frente – é tão empolgante, brilhante e linda. É uma das primeiras músicas que toquei para o bebê antes de ele nascer. O primeiro álbum do U2 que ouvi foi Achtung Baby. Era 1991, e eu tinha então 14 anos de idade. Daquele ponto em diante, comecei o caminho inverso – a cada seis meses, eu comprava um disco do U2. O som dos quais eles foram pioneiros – o baixo e a bateria conduzindo por baixo daquelas trilhas de guitarra etéreas e cheias de efeito flutuando por cima do resto – era diferente de tudo que eu já havia ouvido. Pode ser que eles sejam a única banda boa especializada em hinos em todos os tempos. O que mais adoro no U2 é que a banda é mais importante do que qualquer uma de suas músicas ou álbuns. Adoro o fato de que eles ainda são grandes companheiros e que cada um deles desempenha um papel integral na vida do outro enquanto amigos. Adoro o modo como eles são insubstituíveis. O U2 – como o Coldplay – mantém que todas as músicas que aparecem em seus álbuns sejam creditadas para a banda. E eles são a única banda com mais de 30 anos de existência sem mudanças de membros ou grandes separações. É incrível que a maior banda do mundo tenha tanta integridade e paixão em sua música. Nossa sociedade está totalmente ferrada, a fama é uma perda de tempo ridícula e a cultura da celebridade é nojenta. Há poucas pessoas por aí valentes o suficiente para se manifestar contra isso, que usam a fama de um modo bom. E a cada vez que tento, sinto-me como um idiota, porque vejo Bono conseguindo realizar coisas. Enquanto todo mundo estava xingando George Bush, Bono foi o cara que bateu nas costas de Bush e conseguiu bilhões de dólares para a África. As pessoas podem ser tão cínicas – elas não gostam de quem faz o bem – mas a atitude de Bono é: ‘Não me importo com o que acham, vou falar.’ Ele conseguiu tanto com o Greenpeace, em Sarajevo, no show, exigindo o fechamento da usina nuclear de Sellafield, e continua topando o desafio. Quando chegou a hora de o Coldplay pensar sobre o comércio justo, seguimos seu exemplo de falar a respeito independentemente do que os outros pudessem pensar. Foi isso o que aprendemos com o U2: você tem que ser corajoso o suficiente para ser você mesmo.”

Elvis Presley por Bono – De Tupelo, Mississippi, de Memphis, Tennessee, veio este cara verde, mulherengo, vestido de couro, com sombra no olho – um branquelo caminhoneiro elegante que deve ter arriscado a própria pele para poder se comportar de um modo tão negro e se vestir de modo tão gay. Não estamos falando de Nova York ou mesmo Nova Orleans; estamos falando de Memphis nos anos 50. Isso foi punk rock. Foi revolta. Elvis mudou tudo – musicalmente, sexualmente, politicamente. Em Elvis, você tinha a coisa toda junta; está tudo naquela voz e naquele corpo, ambos elásticos. Enquanto ele mudava de forma, o mesmo acontecia com o mundo: ele era o ícone estilo anos 50 que representava o que os 60 eram capazes, e então repentinamente não era mais. Nos anos 70, ele transformou a celebridade em um esporte violento, mas de um modo interessante, quando mais ele se aproximava da Terra, mais divino se tornava para seus fãs. Suas últimas performances demonstram uma voz ainda maior que seu estômago; você derrama lágrimas verdadeiras enquanto o messias da música canta botando seu coração para fora, transformando o cassino em um templo. Em Elvis, você tinha a receita do rock and roll. A altivez – altivez do gospel. A lama – do Delta, o blues, a liberação sexual. Controvérsia. Mudando o modo como as pessoas viam o mundo. Está tudo lá em Elvis. Eu tinha oito anos quando vi o especial de sua volte em 1968 – o que foi provavelmente uma vantagem. Eu não tinha capacidade crítica para separar os diferentes. Elvis em diferentes categorias ou perceber as contradições. Basicamente, tudo o que eu quero de uma guitarra, um baixo e uma bateria estava presente: um artista incomodado com a distância da sua platéia; uma pessoa que fez um prisma das lentes de maior ângulo da fama; uma sexualidade equiparada somente pela sua sede por instruções divinas. Mas, é sua dança elástica e espástica o mais difícil de explicar – quadris que oscilavam da Europa à África, que é todo o sentida da América, acho eu. Para um garoto irlandês, a voz podia ter explicado a sexualidade dos Estados Unidos, mas a dança exemplificou a energia deste novo mundo prestes a ferver e escorrer, escaldando o resto de nós com novas idéias sobre raça, religião, moda, amor e paz. Certa vez, encontrei-me com Coretta Scott King, John Lewis e alguns outros líderes do movimento pelos direitos civis americanos, e eles me lembraram do apartheid cultural contra o qual o rock and roll se voltava. Acho que o caminho que eles tiveram que percorrer seria muito mais íngreme, se não fosse pelos avanços raciais que a música negra estava fazendo sobre a cultura pop branca. Elvis já estava fazendo o que o movimento pelos direitos civis exigia: quebrando barreiras. Ninguém pensa em Elvis como alguém político, mas isso é política: mudar o modo como as pessoas vêem o mundo. Nos anos 80, o U2 foi para o Sun Studios, em Memphis – o palco do big bang que deu origem ao rock and roll. O descobridor da música de Elvis, Cowboy Jack Clement, abriu o estúdio para que pudéssemos gravar algumas faixas entre as mesmas quatro paredes em que Elvis gravou “Mystery Train”. Ele encontrou o velho microfone valvulado que o Rei havia usado; o reverb era o mesmo: era um lugar pequeno, como um túnel, mas havia uma certa clareza no som. Dá pra ouvi-los naqueles discos da Sun, e esses são os melhores para mim. O Rei ainda não sabia que era o Rei. Elvis não sabe onde o trem vai levá-lo, e é por isso que queremos ser os passageiros. Jerry Schilling, o único membro da Máfia de Memphis a não vendê-lo, me contou que quando Elvis não se sentia bem, deixava a casa grande e ia para sua pequena academia, onde havia um piano. Sem ninguém por perto, só cantava gospel. Ele era o cara mais feliz, quando cantava a sua volta ao caminho da segurança espiritual. Mas, não durava o bastante. O ódio de si mesmo o aguardava quando ele retornava a casa, onde Ra visto atirando em suas TVs, a Bíblia aberta na grande ode ao amor escrita por São Paulo, ‘Coríntios 13’. Elvis claramente não acreditava que a graça do Senhor era grande o suficiente. Alguns comentam que foi o exército, outros que foi Hollywood ou Las Vegas que partiram seu espírito. Acho que provavelmente foi muito mais seu casamento ou sua mãe – ou uma fratura mais sutil e antiga, como a perda de seu irmão gêmeo, Jesse, no nascimento. Ou talvez tenha sido apenas o enorme peso da fama desabando sobre ele. Creio que seu período em Vegas é subestimado. Para mim foi o mais emocionante. Naquela altura, Elvis claramente não tinha o controle de sua própria vida, e mesmo assim havia uma incrível empatia no palco. A grande voz de ópera de seus últimos anos – esta é a que me dói de verdade. Por que queremos que nossos ídolos morram na cruz que eles próprios fizeram, e se não morrem pedimos nosso dinheiro de volta? Mas, você sabe, Elvis engoliu a América antes que a América o engolisse.”

The Clash por The Edge – Mais do que qualquer outro grupo, o The Clash deu origem a milhares de bandas de garagem por toda a Irlanda e Reino Unido. Para o U2 e outras pessoas de nossa geração, vê-los tocar foi uma experiência que mudou nossas vidas. Não há outro modo de descrever. Consigo me lembrar claramente quando vi o Clash pela primeira vez. Foi em Dublin, outubro de 1977. Eles estavam excursionando para divulgar seu primeiro álbum, e tocaram no Trinity College, com 1200 pessoas de capacidade. A apresentação teve um impacto enorme aqui, e ainda encontro pessoas que estão no mundo da música hoje – alguns DJs, outros em bandas – porque viram aquele show. O U2 era novo na época, e aquilo tudo teve uma grande influência na gente. Era algo como: ‘Por que você faz música? O que diabos é fazer música afinal?’ Os membros do Clash não eram grandes músicos, mas o barulho que eles faziam era inegável – a energia pura, visceral, a raiva e o comprometimento. Eles eram crus em todos os sentidos, e não tinham vergonha de ser uma banda que tinha a ver com muito mais do que tocar com precisão e se certificar que as guitarras estivessem afinadas. Não era só entretenimento. Era uma coisa de vida ou morte. Eles fizeram com que levássemos nossa banda a sério. Não acho que teríamos nos tornado uma banda se não fosse por aquele show e por aquela banda. Eles nos mostraram o que era preciso. E tinha tudo a ver com o coração. O conteúdo político e social nas músicas foram certamente uma grande inspiração para o U2. Foi o toque de despertar, amadurecer, enraivecer, assumir posições políticas e fazer barulho por isso. É interessante que os membros do Clash tivessem personalidades tão diferentes. Paul Simonon havia estudado em uma escola de arte, e Joe Strummer era filho de diplomata. Mas, você sentia que eles eram companheiros verdadeiros. Estavam de acordo, atacando a injustiça, o sistema do qual estavam tão cansados. E que eles achavam que precisava acabar. Eu os vi algumas outras vezes depois daquele show em Dublin, e eles sempre tinham algo novo rolando. É uma pena que não ficaram na ativa por mais tempo. A música que fizeram tem tanto espírito de luta e emoção, que simplesmente não envelhece. Você ainda pode ouví-los no som do Green Day e do No Doubt, no Nirvana e nos Pixies, e certamente no U2. Eles eram sinceros no que diziam, e é possível ouvir tudo isso no trabalho deles.

Fonte: Revista Rolling Stone Brasil

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