Especial U2 Show – Parte 14

Especial U2 Show – Parte 14

CHERYL ENGELS

Após algumas semanas retorno a esse projeto, com alguns trechos e informações interessantes do artigo de Cheryl Engels no livro. Ela é a responsável pelo controle de qualidade de gravação e de produção dos discos do U2 desde o Rattle & Hum.

Ela era diretora de controle de qualidade da A&M; Records quando conheceu o U2. Essa não era a gravadora deles, mas eles trabalharam nos estúdios da A&M; durante as gravações do Rattle & Hum. Ela conta que foi o Larry quem se interessou pelo trabalho dela, porque não havia ninguém envolvido com controle de qualidade na gravadora deles, a Island. Ele então mandou pra ela amostras de LPs, cassetes e CDs do U2 fabricados em vários países e pediu a ela que os testasse. Ela achou a qualidade de áudio muito pobre em vários casos, e ainda por cima os discos soavam completamente diferentes de uma país pra outro.

Eles ficaram chocados com isso e decidiram fazer algo a respeito. Acabaram aceitando o convite da A&M; para masterizar os discos no estúdio da companhia, o que deixou Chris Blackwell e a Island preocupados, mas isso virou ponto de honra pra eles, os discos tinham que ter alguém encarregado do controle de qualidade, e foi assim que a Cheryl passou a trabalhar para eles, assim como o engenheiro de masterização Arnie Acosta. Ambos continuam com o U2 até hoje.

Bem, o artigo traz muitas informações técnicas sobre o processo de masterização e fabricação dos discos, mas como sempre vou colocar aqui as opiniões da autora sobre o U2 apenas. Então vamos lá:

Alguns dos membros do U2 e do staff que os empresaria são muito técnicos e apreciam aprender e ouvir sobre esse lado da produção dos discos. Alguns estão mais interessados no lado artístico, no lado criativo das coisas. Eu trabalho mais com o Edge. Ele é o ser humano mais brilhante, na minha opinião. Ele com certeza tem os melhores ouvidos para ouvir detalhes. Fico impressionada com o que ele consegue ouvir, e ele está sempre certo. Nunca o vi fazer uma escolha errada a respeito de qualquer coisa relativa à engenharia de som. E ao mesmo tempo, ele é imensamente criativo. Com ele, o cérebro, o coração e os ouvidos estão envolvidos e ligados e eu acho que é isso que o faz tão único.”

Uma das coisas mais fabulosas em trabalhar com o U2 é que eles te permitem fazer parte do processo criativo. Depois de trabalhar por tantos anos com o Edge, nós desenvolvemos uma espécie de atalho na forma como nos comunicamos. Parece que eu e o Arnie entendemos o que ele espera da masterização, e normalmente conseguimos produzir algo que a banda inteira gosta e aprova. Com apenas algumas breves linhas-mestras, eles nos permitem viajar e criar algo que acaba sendo parte do depoimento artístico deles. Por exemplo, o Edge me telefona e fala “Vou te mandar um mix de uma canção do álbum pra ser editado e masterizado”. Daí eu pergunto “Bem, e qual é a sua idéia? Qual a sua visão?” Frequentemente existem detalhes que você não consegue afinar no console de mixagem. Se você é um engenheiro de som muito bom, você sabe o que pode ser melhorado durante a masterização, e outras coisas que precisam ficar do jeito certo durante a mixagem. Então o que eu pergunto pro Edge é “Existem coisas que você quer ressaltar?” Ele vai me dizer algo como ” Um instrumento em particular nesse mix soa como se quem o toca tivesse um sorriso enorme no rosto, então cuide disso na masterização.” Eu imagino o que ele pode estar querendo dizer, mas quando eu e o Arnie ouvimos o mix nós conseguimos ver aquele integrante da banda com um sorriso gigante de orelha a orelha, e o Edge está certo, há muita energia naquele instrumento que precisa ser balanceada no mixing.

Houve uma ocasião sobre um edit que ambos, Bono e Edge, precisavam ouvir. Eles estavam fazendo um show, e assim que acabou Bono ía embarcar num avião e o Edge estava saindo para encontrar a imprensa. Entregaram um telefone ao Bono enquanto ele deixava o palco, e eu toquei pra ele o edit, então telefonei para o Edge no camarim, e como eles não se íam mais se ver naquela noite, falei pra ele o que o Bono comentou, então anotei os pensamentos do Edge, e assim terminamos a música. As pessoas pensam que a vida de um rockstar é só glamour e festas. Não com essa banda. Eles trabalham! Eu acho que eles vão a uma festa ou duas, mas só depois que o trabalho está concluido.”

No que se refere a masterização, o U2 entende que Arnie sabe como eles ouvem. Existem formas diferentes de abordar o som. Você pode ter uma abordagem sonicamente perfeita, tão alta fidelidade quanto possível, por falta de uma descrição melhor. Bem, essa banda não se interessa por isso totalmente. Eles se interessam em qualquer coisa que seja certa para o clima da música. Durante a masterização do Achtung Baby, nós estávamos no estúdio com uma gravação, e fizemos a música soar aberta, brilhante e luminosa, sonicamente perfeita. Bono entrou na sala e disse “O que vocês fizeram com a minha música? Ela deveria soar como se você estivesse num porão por três dias, e você começa a subir os degraus, saindo de lá para a luz do dia, e como a sua cabeça se sente naquele momento.” Você não pode entregar a música deles para um engenheiro que vai fazê-la soar perfeita. Você tem que entregá-la a alguém que entende que emoção a banda está tentando passar, e o Arnie desenvolveu esse nível de compreensão com a música deles.

STEVE AVERILL

Continuando então, com alguns trechos do livro, agora do artigo de Steve Averill, designer das capas dos discos do U2 (além de ter sido quem sugeriu esse nome a eles), falando sobre seu trabalho:

Eu estive envolvido na primeira sessão de fotos deles, direção de arte e design dos primeiros singles que eles fizeram para a CBS Ireland. A primeira capa que fizemos foi a do U2-3. Antes disso, fizemos um poster pra shows. Foi a primeira peça impressa em que trabalhamos juntos, e tudo se desenvolveu a partir daí. A foto para o primeiro álbum já tinha sido feita. Hugo McGuinness, um amigo da banda, havia tirado as fotos, então escolhemos uma delas que eu achei que funcionaria e essa foi a que a usamos, bastante clara e emocionante. Tiramos muitas fotos no estúdio enquanto eles gravavam o álbum. A capa foi uma decisão corajosa para um primeiro álbum porque o design não realça o nome da banda, e nem o título do disco aparece. É engraçado que o álbum seguinte, October, parece muito mais com um primeiro álbum, porque tem o nome bem grande e uma foto da banda na frente. Mas aquele primeiro álbum se tornou quase um ícone, associado com a sensação de inocência que eles tinham como banda. Para cada capa de álbum que fizemos juntos desde aquela, sempre há muita discussão sobre como as coisas funcionam e o que eles fazem, é um caminho muito sólido que temos seguido. Você sempre tem que surgir com algo que eles gostem, que achem excitante, que eles achem que representa bem sua música. Você não pode ficar preguiçoso, tem que estar sempre afiado. Graficamente e musicalmente você tem que se encaixar no que eles estão fazendo.

October foi obviamente a capa em que eles quiseram trazer a banda um pouco mais para a frente, então tiramos as fotos na região das docas em Dublin. Foi algo bem direto. Eu acho que havia um sentimento no Bono àquela altura de que ele gostava de algumas das capas de discos dos anos 60, onde o título aparecia na frente, como Bob Dylan e outros. Foi uma capa simples de fazer. Acho que, de certa forma, foi uma das capas mais fracas. Foi a capa certa para aquela época, mas podíamos ter escolhido fotos mais fortes. ”

War foi mais complicado, porque eles já tinham o título bem cedo e falavam muito em tentar conseguir autorização para usar fotos do famoso fotógrafo de guerra Don McCullin, ou alguém como ele. Encontrar a imagem certa era crucial. Falamos em procurar uma foto existente que representasse a idéia inteira. Mas isso te deixaria preso a um lugar, como o Oriente Médio ou Belfast ou outro lugar. Eu havia visto um documentário alguns anos antes sobre os nazistas que perseguiam pessoas no gueto polonês. Uma cena ficou gravada na minha mente: um menino parado contra um muro com as mãos atrás das costas, visivelmente aterrorizado. Isso é o que eu estava tentando capturar, essa sensação de medo. Inicialmente pensamos “que garoto vamos usar?” E então, porque já haviam feito uma capa com Peter Rowen e o conheciam, ele pareceu uma escolha óbvia. Suponho que, se eu tivesse me sentado e pensado um pouco mais, teria dito “não, não usem o mesmo garoto – fica muito parecido com aquela capa.” Mas acabou ficando muito bom. A parte tipográfica imita o esquema de cores preto e vermelho das capas da revista Life.”

Eu sabia que o título The Unforgettable Fire vinha de uma exposição sobre Hiroshima e eu entendia o seu significado. De fato uma das capas que eles me apresentaram continha uma vista aérea de Hiroshima, com um alvo desenhado. Mas nós sabíamos que não seria muito apropriado, então tentamos pensar em lugares ou épocas onde o fogo tivesse criado algo que fosse intrinsicamente belo e diferente. Então pensei em castelos e casas incendiadas, onde a estrutura remanescente tivesse presença e estilo. O fogo destroi uma coisa e cria outra. Consegui alguns mapas e num período de três dias visitamos alguns castelos com o fotógrafo Anton Corbijn. Nos demos conta rapidamente de que muitos dos castelos ficavam dentro de vilarejos, ou tinham sido transformados em celeiros, ou não eram assim tão bons para serem fotografados. O que aparece na capa do álbum é um lugar chamado Moydrum Castle no Condado de West Meath, e é na verdade uma antiga mansão, não um castelo.”

A última parte que divulguei trouxe os comentários de Steve Averill sobre seu trabalho na criação das capas dos álbuns do U2, de Boy até The Unforgettable Fire. Concluindo agora então, com mais algumas informações sobre esse assunto, e as capas que seguiram até o Pop:

Unforgettable Fire definiu o tom para o Joshua Tree, quase trazendo a presença física da banda pra dentro da paisagem. Acho que o título provisório para o Joshua Tree era The Two Americas. O conceito do Bono era que o lugar onde o deserto encontra a civilização é um lugar bruto. Então inicialmente decidimos encontrar uma cidade fantasma que pudesse expressar isso – e achamos. A capa foi fotografada em preto e branco perto de Zabriskie Point.

Com o Rattle & Hum eu fui com a banda para Los Angeles e gastamos algum tempo discutindo idéias com eles e as pessoas na Paramount Pictures. Ficou óbvio pra mim bem cedo que não havia sentido em fingir estar fazendo alguma coisa, porque eu não tinha o equipamento em Los Angeles que eu tinha em Dublin e eu estava até contente com isso. Eu sabia como a capa ía ser, então gastei 10 horas pesquisando e editando imagens de shows ao vivo até encontrar aquela imagem do Bono com o holofote apontado para o Edge. A foto veio de Bullet the Blue Sky no show, onde o Bono queria passar a sensação de uma guerra com o holofote, e a música tinha um som pesado e cru. Isso veio até certo ponto de suas experiências quando esteve na América do Sul. Bem cedo ele sabia, mais ou menos, que essa era a imagem que ele queria mostrar. No fim, acabou sendo refeita em estúdio com o Anton Corbijn.

Achtung Baby foi o próximo, e representou uma imensa mudança em termos de reinvenção da banda. A sensação de ironia e divertimento, de brincar de ser um rock star, era a tônica do momento. E foi provavelmente um dos períodos mais extensamente fotografados para eles – Santa Cruz de Tenerife, Berlim, Marrocos. Começamos tentando achar uma imagem apenas que pudesse projetar o que eles queriam fazer e, passo a passo, essa imagem única se transformou em múltiplas imagens, de forma a refletir essa mudança completa. Decidimos então fazer uma montagem, com o maior número de imagens possíveis na capa. Existem cerca de 36 fotos no pacote completo, e isso causa uma impressão extraordinária. O sistema de grade foi introduzido, e depois seguido em ambos, Zooropa e Pop. Nós trouxemos o mesmo tema através de todas aquelas imagens em todas aquelas capas.

Achtung Baby representou uma imensa abertura para a forma como fazíamos as coisas. Zooropa aconteceu muito rapidamente. A turnê Zooropa se desenrolava na Europa e eles voltavam para o estúdio em Dublin com a frequência possível, quase a cada 2 dias, pra trabalhar nas gravações. Gastamos muitas noites no estúdio deles trabalhando em idéias, enquanto eles trabalhavam nas músicas. Era para ser um EP e depois virou um álbum, então o título da turnê foi sugerido. Inicialmente propusemos idéias baseadas na bandeira da União Européia, mas já haviam sido criadas uma ou duas capas com essa imagem. Em vez disso, criamos uma bandeira eletrônica usando computadores e imagens sobrepostas. Pegamos imagens da contracapa e sobrepusemos com títulos e outras coisas. Foi também a primeira capa que fizemos num Mac, então estávamos ainda experimentando com tecnologia informatizada. Ao longo dos anos, desenvolvemos um certo entrosamento com as pessoas. Você tem uma idéia do que eles estão pensando ou pra onde estão indo.

A próxima capa de álbum que fizemos para o U2 foi a do Pop, pra qual nós queríamos um design que de certa forma refletisse artistas pop como Andy Warhol e Lichtenstein, não como uma homenagem, mas mais como algo que eles teriam feito se tivessem a tecnologia de computadores que nós temos. Nós queríamos que o programa da turnê se expandisse além disso. Por si só aquela turnê era fenomenal, e a capa do programa se transformou num reflexo exatamente do que acontecia naquela época.”

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