O disco que fez dos U2 um fenómeno global

O disco que fez dos U2 um fenómeno global

Fonte: Diário de Notícias, de Portugal

Em 1987, os U2 viram-se transformados no maior fenómeno de popularidade rock’n’roll do seu tempo, estatuto que ainda hoje mantêm. Depois de quatro bem sucedidos álbuns de originais editados entre 1980 e 84, com canções como Sunday Bloody Sunday ou Pride (In the Name of Love) entretanto transformadas em hinos de insubmissão por toda uma nova geração de almas sedentas de rebeldia rock’n’roll, somadas digressões que cativaram aplausos e admiradores, faltava o ingrediente final para que a banda nascida em Dublin, na Irlanda, se transformasse no tal acontecimento global que todos então já adivinhavam mais dia, menos dia.

O salto deveu-se a The Joshua Tree, álbum editado em Março de 1987 e que abriu definitivamente as portas da América à música do grupo, daí catapultando-o para a primeira linha dos acontecimentos musicais à escala mundial. O disco deu-lhes os seus dois primeiros Grammys, os dois primeiros singles no número um da tabela americana, capa na Time, vendas na ordem dos mais de 20 milhões (só metade nos EUA) e motivou uma digressão, a primeira da banda por estádios, que amplificou os efeitos que o álbum lançara.

The Joshua Tree, contudo, não foi um acaso. A sua história começa no Verão de 1985, dias depois da muito bem sucedida passagem do grupo pelo Live Aid. Bono, a voz do grupo, e a sua mulher, Ali, passam um mês na Etiópia. Sem publicidade, dedicaram o seu tempo a um projecto educacional. Meses depois, em Dublin, actuam no Self Aid. E, mais tarde, rumam aos EUA para ser cabeças de cartaz da digressão de beneficência A Conspiracy of Hope, que assinalava os 25 anos da Amnistia Internacional.

Os confrontos que vivia o mundo real, enfatizados por uma posterior viagem a El Salvador e à Nicarágua, motivaram o ser político que já morava na consciência de Bono, mas até então ainda com poucas manifestações, salvo em pontuais canções. A esta inquietude, somou-se o confronto com a América profunda que descobrem, com mais atenção, durante a digressão com a Amnistia Internacional. Uma América que não era dos filmes do velho oeste mas, como o baixista Adam Clayton descreveria mais tarde a um programa do VH-1, a dos dias de Reagan. Este clima emocional, mais sombrio, chega à sala de ensaios do grupo num tempo em que Bono e The Edge, o guitarrista, optam por uma escrita mais clássica e convencional, afastando-se assim do veio pós-punk que os vira nascer.

A América, a da música, dos blues, do gospel, de Bob Dylan e Patti Smith, recentemente descoberta pela banda, assim como a América dos livros de Tennessee Williams, de Flannery O’Connor, de Norman Mailer e Raymond Carver, que então liam em viagem, ganhou também expressão nas canções que começavam a nascer. Canções que contam uma história, partindo do deserto, em Where the Streets Have no Name, repensa a América em Bullet the Blue Sky, evoca conflitos alguns milhares de quilómetros a sul em Mothers of the Disapeared e regressa aos seus terrenos já conhecidos em Running to Stand Still ou Red Hill Mining Town.

Uma história que não se faz apenas dos factos que se observam e comentam, mas também das reflexões de Bono, seja no debate dos medos que o amor encerra em With or Without You, nas tentações de Trip Through the Wires, na memória de um amigo perdido em One Tree Hill.

Imortalizado por uma capa na qual uma a banda é revelada numa foto de Anton Corbijn tirada no Vale da Morte (Califórnia), e não junto da “verdadeira” Joshua Tree, em Palm Springs, este tornou-se um marco na história dos U2, na da música dos anos 80 e será, certamente, recordado um dia como um dos discos de referência da história do rock’n’roll.

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